terça-feira, 7 de junho de 2011

Luís Buñuel: o cinema surrealista

Gabriel Alves Leite
Débora Nogueira Juliano
 

O cineasta espanhol Luís Buñuel Portolés (1900-1983) é um dos mais controversos do mundo. Em suas obras emblemáticas estavam patentes de forma concentrada e intensa todos os temas básicos que a sua obra posterior continuaria a refletir mais discretamente, mas com igual poder: o amor louco, o anti-clericarismo, a rebeldia e o inconformismo diante do estabelecido e do convencional, uma ânsia de transcendência, expressos em imagens oníricas e alucinantes, cheias de dureza, de corrosivo humor negro.
Buñuel foi objeto de estudo do professor doutor Ricardo Zani, da Faculdade de Comunicação e Artes do Ceunsp. “Eu quero é discutir o quanto de história está inserida na obra de Buñuel e o meu objetivo é mostrar o quanto essas influências vividas pelo autor teve desde a sua infância na Espanha, um pais muito católico, muito rígido na educação e o quanto essa herança espanhola e o gosto pela idade média refletiram nos seus filmes", afirma Zani. Sua tese de doutorado, “O Carnaval Buñuelesco: Uma Aurora ao Entardecer”, foi defendida na Unicamp no ano passado.
O professor Ricardo Zani se formou bacharel em Artes Plásticas pela Unesp em 1997. E concluiu o seu mestrado sobre as obras surrealistas de Luís Buñuel em 2001, também na Unicamp. Desde 2000 leciona para alunos das áreas de Comunicação e de Artes.

“Na adolescência eu fazia umas associações meio estranhas sobre as imagens surrealistas e as músicas do Pink Floyd. Isso me levou a fazer um curso de Artes e desenvolver trabalhos práticos e até pesquisas na área do surrealismo. Na Unicamp, durante meu mestrado, acabei tendo contato com os filmes do Luís Buñuel e que também é cineasta surrealista. Daí desenvolvi uma dissertação no mestrado sobre ele. O doutorado, que na verdade é um desdobramento do mestrado é uma visão mais específica do que eu já tinha escrito,” completa o professor.

Como parte de sua pesquisa, Zani seleciona três filmes de três fases distintas de Buñuel. O primeiro é “O cão da luz”, que é o manifesto, o lançamento do cinema surrealista de fato e que representa a primeira fase do autor.

Depois ele analisa o filme “Veridiana”(1961) que é o da segunda fase, quando Buñuel está tentando fazer as pazes com o governo da Espanha, depois de ter sido convidado à sair do país. Vale lembrar que, nesta época, o país vivia sob ditadura do general Francisco Franco, uma das mais longas e reacionárias da Europa.

E “A bela da tarde”(1967), também é o obra mais conhecida dele, é o da terceira fase. Uma fase mais elaborada de seus filmes, período em que receberá um investimento maior para a realização de suas películas.

Zani faz um recorte desses três filmes e o analisa “Angelus”, do pintor realista francês Jean François Millet. “Além da própria análise da imagem, aí tem as leituras de autores que escreveram sobre Buñuel, dos autores que falam da carnavalização. Nesse caso, não podemos deixar de mencionar teórico russo Mikhail Bakhtine. Depois peguei os teóricos franceses que falam da Idade Média, como o historiador francês Le Goff e o Georges Duby. Depois eu selecionei estudiosos de Buñuel, como Augustín Sánchez Vidal e o Frederico Fellini que me ajudaram a concluir a minha tese de doutorado,” complementa Zani.

Carnavalização é a marginalização de padrões (sociais, morais, ideológicos) em favor de conteúdos mais ligados aos instintos e aos sentidos, ao riso, à sensualidade; condição do que apresenta essa ruptura e mistura de tais elementos.

Assim como em suas obras, a vida de Luís Buñuel é marcada pela contradição. Ele se dizia “ateu graças a Deus” apesar de ter tido uma formação muito rígida, e de ter estudado em colégio de jesuítas. Ao mesmo tempo, ele tinha uma relação muito forte com essas questões da Idade Média voltada para o baixo corporal, para o carnaval e pela exploração do corpo.

Além da contradição, o que aparece muito na obra de Buñuel é o grande amor louco surrealista que coloca a mulher como objeto de desejo que nunca é alcançado. E esta relação do cinema, das imagens, que são muito próximas da realidade e que se alternam com esse devaneio, com os sonhos e com o onírico. O cinema surrealista, sobretudo o de Buñuel, não distingue muito bem e não dá uma relação muito clara se o que estamos vendo é a realidade química ou o sonho do personagem.

Para o professor, Buñuel é visto como um cineasta difícil, porque sua narrativa não é linear. Ela não estabelece uma distinção clara entre a vida e os devaneios de seus personagens. Isto, para um espectador acostumado com uma narrativa clássica, torna-se desconfortável visualmente. Ele é visto como  um artista elitizado por tratar de questões próximas ao seu mundo, à sua educação burguesa e socialmente privilegiada.
Por fim a obra de Luis Buñuel deve ser vista como a representação do desejo e suas sombras. Deve ser vista como uma obra contraditória feita por um burguês que odiava a burguesia, realizada por um ateu que o era graças a Deus. 
Quem foi Buñuel
Luis Buñuel era o primogênito de sete filhos. O pai, ferreiro bem-sucedido, casou aos 43 anos; a mãe, Maria Portolés, então tinha 18. Quando a família se mudou para Saragoça, Buñuel iniciou os estudos com os jesuítas, recebendo a formação religiosa que se tornaria marcante em seus filmes.
Em 1917, foi para Madri, ingressando na faculdade de agronomia indo morar na residência estudantil, onde conheceu Federico García Lorca e Salvador Dalí. Deixou aquela faculdade para estudar filosofia e letras e graduou-se em 1924. No ano seguinte Buñuel, casou-se com Jeanne Rucar. Trabalhou na França com o cineasta Jean Epstein, como assistente de direção e roteirista e estudou na Academie du Cinéma (Paris).
Depois de tudo isso Buñuel apresentou vários filmes sendo o último "Meu Último Suspiro" (1982),  um livro charmoso e elucidativo. Vítima do câncer, morreu aos 83 anos na Cidade do México.


Gabriel Alves Leite e Débora Nogueira Juliano são estudantes do Curso de
 Jornalismo do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio (Ceunsp)